SEXTA FEIRA SANTA

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Sexta-feira Santa ou Sexta-Feira da Paixão ou Sexta-Feira Maior é uma data religiosa cristã que relembra a crucificação de Jesus Cristo e sua morte no Calvário. O feriado é observado sempre na sexta-feira que antecede o Domingo de Páscoa, o sexto dia da Semana Santa no cristianismo ocidental e o sétimo no cristianismo oriental (que conta também o Sábado de Lázaro, anterior ao Domingo de Ramos). É o primeiro dia (que começa na noite da celebração da Missa da Ceia do Senhor) do Tríduo Pascal e pode coincidir com a data da Páscoa judaica[1][2][3].

Este dia é considerado um feriado nacional em muitos países pelo mundo todo e em grande parte do ocidente, especialmente as nações de maioria cristã.

De acordo com os relatos nos evangelhos, os guardas do templo, guiados pelo apóstolo Judas Iscariotesprenderam Jesus no Getsêmani. Depois de beijar Jesus, o sinal combinado com os guardas para demonstrar que era o líder do grupo, Judas recebeu trinta moedas de prata (Mateus 26:14-16) como recompensa. Depois da prisão, Jesus foi levado à casa de Anás, o sogro do sumo-sacerdote dos judeus, Caifás. Sem revelar nada durante seu interrogatório, Jesus foi enviado para Caifás, que tinha consigo o Sinédrio reunido (João 18:1-24).

Pietà, uma imagem da Lamentação de Cristo.
Por Michelângelo, atualmente na Basílica de São Pedro, no Vaticano.

Muitas testemunhas apareceram para acusar Jesus, mas seus relatos conflitavam entre si e Jesus manteve-se em silêncio. Finalmente, o sumo-sacerdote desafiou Jesus dizendo: «Eu te conjuro pelo Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus.» (Mateus 26:63) A resposta de Jesus foi: «Tu o disseste; contudo vos declaro que vereis mais tarde o Filho do homem sentado à direita do Todo-poderoso e vindo sobre as nuvens do céu.» (Mateus 26:64) Por conta disto, Caifás condenou Jesus por blasfêmia e o Sinédrio concordou em sentenciá-lo à morte (Mateus 26:57-66). Pedro, que esperava no pátio, negou Jesus por três vezes enquanto o interrogatório se desenrolava, exatamente como Jesus havia previsto.

Na manhã seguinte, uma multidão seguiu com Jesus preso até o governador romano Pôncio Pilatos e o acusaram de subversão contra o Império Romano, de se opor aos impostos pagos ao césar e de autodenominar “rei” (Lucas 23:1-2). Pilatos autorizou os líderes judeus a julgarem Jesus de acordo com seus próprios costumes e passar-lhe a sentença, mas foi lembrado pelos líderes judeus que os romanos não lhes permitiam executar sentenças de morte (João 18:31).

Pilatos interrogou Jesus e afirmou para a multidão que não via fundamentos para uma pena de morte. Quando ele soube que Jesus era da Galileia, Pilatos delegou o caso para o tetrarca da região, Herodes Antipas, que, como Jesus, estava em Jerusalém para a celebração da Páscoa judaica. Herodes também interrogou Jesus, mas não conseguiu nenhuma resposta e enviou-o de volta a Pilatos, que disse para a multidão que nem ele e nem Herodes viam motivo para condenar Jesus. Ele então se decidiu por chicoteá-lo e soltá-lo, mas os sacerdotes incitaram a multidão a pedir que Barrabás, que havia sido preso por assassinato durante uma revolta, fosse solto no lugar dele. Quando Pilatos perguntou então o que deveria fazer com Jesus, a resposta foi: «Crucifica-o!» (Marcos 15:6-14). A esposa de Pôncio Pilatos havia sonhado com Jesus naquele mesmo dia e alertou Pilatos para que ele não se envolvesse «na questão deste justo» (Mateus 27:19) e, perplexo, o governador ordenou que ele fosse chicoteado e humilhado. Os sumo-sacerdotes informaram então Pilatos de uma nova acusação e exigiram que ele fosse condenado à morte por “alegar ser o Filho de Deus”. Esta possibilidade atemorizou Pilatos, que voltou a interrogar Jesus para descobrir de onde ele havia vindo (João 19:1-9).

Voltando à multidão novamente, Pilatos declarou que Jesus era inocente e lavou suas mãos para mostrar que não queria ter parte alguma em sua condenação, mas mesmo assim entregou Jesus para que fosse crucificado para evitar uma rebelião (Mateus 27:24-26). Jesus carregou sua cruz até o local de sua execução (com a ajuda de Simão Cireneu), um lugar chamado “da Caveira” (Gólgota em hebraico e Calvário em latim). Lá foi crucificado entre dois ladrões (João 19:17-22).

Jesus agonizou na cruz por aproximadamente seis horas. Durante as últimas três, do meio-dia às três da tarde, uma escuridão cobriu “toda a terra” (Mateus 27:45Marcos 15:13 e Lucas 23:44).

Quando Jesus morreu, houve um terremoto, túmulos se abriram e a cortina do Templo rasgou-se cima até embaixo. José de Arimateia, um membro do Sinédrio e seguidor de Jesus em segredo, foi até Pilatos e pediu o corpo de Jesus para que fosse sepultado (Lucas 23:50-52). Outro seguidor de Jesus em segredo e também membro do Sinédrio, Nicodemos, foi com José de Arimateia para ajudar a retirar o corpo da cruz (João 19:39-40). Porém, Pilatos pediu que o centurião que estava de guarda confirmasse que Jesus estava morto (Marcos 15:44) e um soldado furou o flanco de Jesus com uma lança, o que provocou um fluxo de sangue e água do ferimento (João 19:34).

José de Arimateia então levou o corpo de Jesus, envolveu-o numa mortalha de linho e o colocou em um túmulo novo que havia sido escavado num rochedo (Mateus 27:59-60) que ficava num jardim perto do local da crucificação. Nicodemos trouxe mirra e aloé e ungiu o corpo de Jesus, como era o costume dos judeus (João 19:39-40). Para selar o túmulo, uma grande rocha foi rolada em frente à entrada (Mateus 27:60) e todos voltaram para casa para iniciar o repouso obrigatório do sabá, que começou ao pôr-do-sol (Lucas 23:54-56).

Por Caroline Wyatt, BBC


'A astronomia está no coração do estabelecimento da data', diz astronômo no Observatório Real de Greenwich, em Londres — Foto: Getty Imags/BBC

‘A astronomia está no coração do estabelecimento da data’, diz astronômo no Observatório Real de Greenwich, em Londres — Foto: Getty Imags/BBC

Neste ano, em 2021, o domingo de Páscoa será celebrado no dia 4 de abril. Mas nem sempre é assim. Nos últimos dez anos, a Páscoa já foi comemorada em dez datas diferentes, com variações entre 27 de março e 24 de abril.

Mas por que não há uma data fixa para a Páscoa?

Segundo afirmava Beda, o Venerável, religioso inglês que viveu no século 7, a Páscoa se dá no primeiro domingo depois da primeira lua cheia após o equinócio da primavera no hemisfério norte (20 de março, em 2018).

“A astronomia está no coração do estabelecimento da data para a Páscoa. (A data) depende de dois fatos astronômicos – o equinócio da primavera e a lua cheia”, disse Marek Kukula, astronômo no Observatório Real de Greenwich, em Londres.

Trata-se de um “feriado móvel”, e isso se dá graças ao sistema complexo que foi desenvolvido para tentar calcular a Páscoa (e a Páscoa Judaica) a partir do céu, acomodando calendários diferentes.

A data mais frequente para a Páscoa nas igrejas ocidentais tem sido 19 de abril, mas o evento já chegou a cair até em 25 de abril.

A data da Páscoa varia, entre outras razões, na tentativa de harmonizar os calendários lunares e solares — Foto: Getty Images/BBC

A data da Páscoa varia, entre outras razões, na tentativa de harmonizar os calendários lunares e solares — Foto: Getty Images/BBC

O nosso calendário não combina exatamente com os ciclos astronômicos.

“Durante milhares de anos vêm sendo feitos cálculos e ajustes na tentativa de coincidir os calendários artificiais com a astronomia. Mas, exatamente pela falta de uma combinação precisa entre eles, são necessários cálculos complexos para se determinar o dia exato do equinócio e da lua cheia”, acrescentou Kukula.

Apesar da famosa briga da Igreja Católica com Galileu, em 1633, por divergências em relação aos estudos de astronomia do físico, os religiosos sempre souberam que era preciso calcular as datas para a Páscoa e os dias santos – e que para isso era necessário recorrer ao estudo dos astros.

Com esse objetivo, a Igreja Católica construiu seu primeiro observatório em 1774.

Mistura

O complicado sistema de determinação da data da Páscoa é resultado da combinação de calendários, práticas culturais e tradições hebraicas, romanas e egípcias.

O calendário egípcio era baseado no Sol, prática adotada primeiramente pelos romanos e posteriormente incorporada pela cultura cristã. O judaísmo baseia o calendário hebraico parcialmente na Lua, e o islamismo também utiliza fases da Lua.

A data da Páscoa varia não somente pela tentativa de harmonizar os calendários lunares e solares, mas também há outras complicações que acabam interferindo, como o fato de diferentes vertentes do cristianismo usarem fórmulas distintas em seus cálculos.

Em 1582 foi criado o Calendário Gregoriano, adotado e promovido pelo papa Gregório para fazer com que a Páscoa caísse mais cedo e fosse mais fácil de ser calculada. Esse é o calendário que usamos até hoje.

Gregório 13 introduziu o calendário gregoriano, ainda usado no mundo ocidental — Foto: Getty Images/BBC

Gregório 13 introduziu o calendário gregoriano, ainda usado no mundo ocidental — Foto: Getty Images/BBC

Segundo a Bíblia, a morte e ressurreição de Jesus, os eventos celebrados pela Páscoa, ocorreram na época da Páscoa Judaica.

A Páscoa Judaica era celebrada na primeira lua cheia depois do equinócio da primavera no hemisfério norte.

Mas isso levou os cristãos a celebrar a Páscoa em diferentes datas. No fim do século 2, algumas igrejas celebravam a Páscoa junto com a Páscoa Judaica, enquanto outras marcavam a data no domingo seguinte.

No ano 325, a data da Páscoa foi unificada graças ao Concílio de Nicéia.

A Páscoa passaria a ser no primeiro domingo depois da primeira lua cheia que ocorresse após o equinócio da primavera (ou na mesma data, caso a lua cheia e o equinócio ocorressem no mesmo dia).

Domingos diferentes

Mesmo assim, tradições e culturas diferentes continuaram fazendo cálculos distintos para a data.

Um exemplo se deu na Inglaterra, no ano de 664. No reino de Northumbria, o rei Oswiu e sua esposa celebravam a Páscoa em domingos diferentes. O rei observava a tradição irlandesa, e a rainha, a romana. Ela era originária de uma parte do reino que tinha sido evangelizada segundo as tradições romanas, enquanto a cidade natal do rei Oswiu seguia a tradição irlandesa.

Em consequência, um certo ano o rei celebrou a Páscoa em um domingo, mas a rainha ainda estava no período da quaresma. Para acertar a data, o rei convocou um sínodo (assembleia de religiosos) na cidade de Whitby.

A data mais frequente para a Páscoa nas igrejas ocidentais tem sido 19 de abril — Foto: Getty Images/BBC

A data mais frequente para a Páscoa nas igrejas ocidentais tem sido 19 de abril — Foto: Getty Images/BBC

Na defesa da tradição irlandesa, estava o bispo Colman de Lindisfarne. São Wilfrid, um nativo de Northumbria treinado em Roma, defendeu a tradição romana.

“Em um ponto crucial do debate, ele mencionou São Pedro, o guardião das chaves do paraíso, que as recebeu do próprio Cristo. E o rei Oswiu, que presidia o sínodo, ficou muito impressionado”, disse Michael Carter, membro do Patrimônio Histórico Inglês.

Com isso, a decisão foi tomada a favor da tradição romana.

“O Sínodo de Whitby garantiu que a Igreja na Inglaterra passasse a adotar a prática ocidental padrão. Isso significou a unificação da celebração do mais importante evento do calendário cristão pela igreja inglesa, o dia da ressurreição de Cristo. Isso persistiu no país (…) até a Reforma Anglicana, quando a Inglaterra rompeu com o padrão religioso e cultural da Europa”, acrescentou Carter.

Ortodoxos

As tradições ortodoxas dentro do cristianismo continuaram usando o Calendário Juliano em vez de aceitar a reforma do calendário imposta pelo papa Gregório.

As igrejas ortodoxas, portanto, continuaram a celebrar a Páscoa e o Natal em datas diferentes das tradições ocidentais ou romanas.

Mas isso pode mudar? O papa Tawadros 2º de Alexandria, líder da Igreja Ortodoxa Copta, espera que as diferentes vertentes do cristianismo consigam chegar a um acordo sobre essa importante questão.

Pouco depois de reunir-se com ele, Justin Welby, arcebispo da Cantuária (o equivalente ao papa para a Igreja Anglicana), divulgou uma notícia surpreendente em janeiro de 2018: depois de muitos séculos de desacordo, surgiram novas esperanças de que a data da Páscoa possa ser uma data que todos os cristãos celebrem juntos.

O Concílio de Nicéia acertou muitas disputas centro da igreja, incluindo a data da Páscoa — Foto: Getty Images/BBC

O Concílio de Nicéia acertou muitas disputas centro da igreja, incluindo a data da Páscoa — Foto: Getty Images/BBC

“Durante nossa visita ao Vaticano, em 2013, o papa Tawadros falou novamente sobre o tema com o papa Francisco em Roma”, disse o bispo Angaelos, bispo geral da Igreja Ortodoxa Copta na Grã-Bretanha.

“Parece haver uma disposição entre parte das lideranças da Igreja Cristã para pelo menos avaliar esta possiblidade.”

No entanto, ele admite que o caminho parece ser longo. “A dificuldade é que todos precisam sacrificar algo, pois cada um de nós tem o seu próprio jeito de calcular a Páscoa e calculamos assim por séculos”, disse.

Ainda não há um cronograma e o bispo Angaelos afirma que a “tarefa é monumental”. “Estamos falando a respeito com muita gente, muitas culturas diferentes, igrejas diferentes e líderes religiosos diferentes. Será uma tarefa monumental. Mas a ideia está lá.”

E o que os astrônomos acham de uma Páscoa unificada? “De certo modo, a astronomia ficaria fora da equação”, disse Marek Kukula.

“Ainda seria necessário regular o calendário – você ainda precisaria ter anos bissextos e ajustar segundos – mas a Páscoa deixaria de ser um feriado móvel e isto tornaria bem mais simples coisas como o planejamento de feriados escolares. Entretanto, se as pessoas vão querer fazer isso ou não, passa por uma questão religiosa.”

E, levando em conta toda a história por trás da data, o debate sobre a questão ainda poderá se estender por muito tempo.